Lenda da Caldeira de Pêro Botelho
Um pequeno conto moral, a castigar um temperamento sulfuroso. O silêncio é o que recebe de volta Pêro Botelho sempre que implo- ra «Tirem-me daqui! Tirem-me daqui!», lá do fundo da gruta das Furnas, na ilha de São Miguel, para onde estará remetido desde há tempos imemoriais.
Homem de deplorável feitio, tinha o hábito, como os demais habi- tantes da região, de cozer vimes e milho nas caldeiras vulcânicas de água fervente. Numa delas, da qual exala forte cheiro a enxo- fre, era mais comum, porém, o uso das lamas na cura de diversas doenças, como o reumatismo.
Diz-se que, certo dia, ao ir buscar a balsâmica matéria, Pêro Botelho escorregou e deixou-se cair caldeira adentro. Ainda esboçou um pedido de ajuda, mas ninguém o terá ouvido. E também nunca mais foi visto. O único sinal de vida seria o do tal clamor por um hipotético resgate.
Ou, bem vistas as coisas, até sucederia um pouco mais. É que, se al- guém se abeirasse da cálida cavidade e chamasse por ele, receberia como resposta um bafejo fumarento de pedras, cinzas e lama. Para além da mais ou menos recorrente súplica, Pêro Botelho respondia de forma intempestiva a qualquer tentativa de com ele entabu- lar um diálogo, mesmo que bem-humorado. E quando crianças e adultos arremessavam pedras para o interior da caldeira, dizendo
«Dá um espirro, Pêro Botelho!», elas eram expelidas de volta. Por isso, sempre que alguém se aproximava da caverna para ir buscar a terapêutica lama, ficava assustado com o que de lá pudesse vir. A partir de então, os moradores de Povoação passaram a chamar de Caldeira de Pêro Botelho ao orifício fumegante.
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